Desobediência civil
Por Juremir Machado da Silva - 09.08.12
Por Juremir Machado da Silva - 09.08.12
Livros bons não faltam no Brasil. Salvo na ficção. Nas reportagens, por exemplo, pululam os bons textos. “A mulher que era o general da casa – histórias da resistência civil à ditadura” (Arquipélago editorial), do jornalismo Paulo Moreira Leite, é um deles. Moreira Leite, como correspondente da Gazeta Mercantil em Washington, obteve um documento com a transcrição dos 28 minutos do encontro, ocorrido em 30 de junho de 1962, na Casa Branca, entre o presidente John Kennedy, o seu assessor Richard Goodwin e o embaixador americano no Brasil, Lincoln Gordon. Hoje, conhece-se até uma gravação em áudio dessa reunião. Nela, Gordon pediu autorização para apoiar a preparação de um golpe militar no Brasil e ajuda financeira para isso. Fixou em oito milhões de dólares o necessário para derrubar Jango. Kennedy regateou e bateu o martelo em cinco milhões de dólares.
Paulo Moreira Leite é um defensor ferrenho da Comissão da Verdade. Justifica: “Os crimes contra os direitos humanos têm uma natureza específica: envolvem agentes do Estado que perverteram suas funções para perseguir e maltratar cidadãos que não tiveram o direito de se defender”. Além de perseguidos e torturados, quando não mortos ou obrigados a fugir para o exílio, eles foram julgados pelo Superior Tribunal Militar: “Um levantamento realizado pelo ‘Brasil: nunca mais’, a partir de 695 processos da Justiça Militar, entre 1964 e 1979, mostra que 7.367 brasileiros foram levados ao banco dos réus para prestar contas de atos considerados subversivos”. Mais: “Em 80% dos casos a denúncia sequer envolvia acusação de participação em ações armadas”. Era gente que tinha o péssimo hábito de exigir democracia ou de proteger perseguidos do regime ditatorial paranoico.
No seu livro, Paulo Moreira Leite traça o perfil de pessoas que resistiram como puderam: Therezinha Zerbini, mulher de um general que ficou do lado de Jango, o pastor Jaime Wright, que seria o principal organizador do precioso inventário da tortura chamado “Brasil: nunca mais”, o sociólogo Florestan Fernandes, o empresário e bibliófilo José Mindlin, o militante comunista moderado Armênio Guedes, o quatrocentão Plínio de Arruda Sampaio, homem da reforma agrária, o rabino Harry Sobel e o jornalista Washington Novaes. Para arrematar, um perfil do americano que bancou o golpe: Lincoln Gordon. É comovente conhecer detalhes dessa resistência quase impossível, improvisada, corajosa e, claro, heroica.
Paulo, irmão de Jaime Wright, acabou assassinado pela ditadura. Mesmo assim, “foi julgado à revelia, como se vivo estivesse, sendo condenado a cinco anos de prisão por atividades subversivas”. Sobel, que teria sua vida destruída pelo roubo de quatro gravatas nos Estados Unidos, já depois do fim da ditadura, teve a grandeza de não mandar enterrar o jornalista Vladimir Herzog, assassinado pelo regime, no setor do suicidas do cemitério judeu de São Paulo. O suicídio de Vlado, farsa inventada por seus algozes, começou a ser desmascarado com esse gesto. Que baita livro! Para envergonhar alguns.
http://www.correiodopovo.com.br/blogs/juremirmachado/
Paulo Moreira Leite é um defensor ferrenho da Comissão da Verdade. Justifica: “Os crimes contra os direitos humanos têm uma natureza específica: envolvem agentes do Estado que perverteram suas funções para perseguir e maltratar cidadãos que não tiveram o direito de se defender”. Além de perseguidos e torturados, quando não mortos ou obrigados a fugir para o exílio, eles foram julgados pelo Superior Tribunal Militar: “Um levantamento realizado pelo ‘Brasil: nunca mais’, a partir de 695 processos da Justiça Militar, entre 1964 e 1979, mostra que 7.367 brasileiros foram levados ao banco dos réus para prestar contas de atos considerados subversivos”. Mais: “Em 80% dos casos a denúncia sequer envolvia acusação de participação em ações armadas”. Era gente que tinha o péssimo hábito de exigir democracia ou de proteger perseguidos do regime ditatorial paranoico.
No seu livro, Paulo Moreira Leite traça o perfil de pessoas que resistiram como puderam: Therezinha Zerbini, mulher de um general que ficou do lado de Jango, o pastor Jaime Wright, que seria o principal organizador do precioso inventário da tortura chamado “Brasil: nunca mais”, o sociólogo Florestan Fernandes, o empresário e bibliófilo José Mindlin, o militante comunista moderado Armênio Guedes, o quatrocentão Plínio de Arruda Sampaio, homem da reforma agrária, o rabino Harry Sobel e o jornalista Washington Novaes. Para arrematar, um perfil do americano que bancou o golpe: Lincoln Gordon. É comovente conhecer detalhes dessa resistência quase impossível, improvisada, corajosa e, claro, heroica.
Paulo, irmão de Jaime Wright, acabou assassinado pela ditadura. Mesmo assim, “foi julgado à revelia, como se vivo estivesse, sendo condenado a cinco anos de prisão por atividades subversivas”. Sobel, que teria sua vida destruída pelo roubo de quatro gravatas nos Estados Unidos, já depois do fim da ditadura, teve a grandeza de não mandar enterrar o jornalista Vladimir Herzog, assassinado pelo regime, no setor do suicidas do cemitério judeu de São Paulo. O suicídio de Vlado, farsa inventada por seus algozes, começou a ser desmascarado com esse gesto. Que baita livro! Para envergonhar alguns.
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