Juremir Machado da Silva
Na boa, o que tem de safado e de charlatão neste
mundo! Especialistas de araque, que enchem os bolsos dando pareceres
sob encomenda, inventaram um argumento cretino para relativizar as demandas
de professores por aumento de remuneração: salário
não garante qualidade nem dobra o aprendizado dos alunos. É
a sacanagem na milésima potência. Segundo o último
Censo do IBGE, as carreiras de professor de ensino fundamental e médio
continuam tendo as piores compensações salariais do Brasil
em relação a todas as outras de profissionais com nível
superior. Um professor de ensino fundamental ganha em média 59%
do que recebe um outro trabalhador formado em universidade.
Salário é determinante. Pagar bem permite
atrair os melhores. Ganhar bem possibilita atualizar-se, ir ao cinema,
viajar, comprar livros, abrir horizontes, manter-se motivado, fazer
cursos e tudo o que se sabe e vale para qualquer profissão. Vá
dizer a um juiz que ganhar bem não dobra a qualidade das suas
sentenças! Explique a um alto executivo que a qualidade da sua
gestão não está diretamente relacionada aos seus
ganhos. Convença um centroavante que fazer muitos ou poucos gols
nada tem a ver com o que ele embolsa no final do mês. O Brasil
mente em termos de educação. A hipocrisia corre solta.
No fundo, a maioria acha que ser professor de ensino fundamental é
barbada e, como exige muita gente, tem de pagar pouco mesmo. Se o cara
quer ganhar mais, que vá estudar para ser juiz ou alto executivo
de algum banco.
Minha função é abalar as crenças
de alguns: salário é tudo. Só pode cobrar mérito
quem paga decentemente. A questão dos salários dos professores
no Brasil tem a ver com (baixo) poder de pressão, prioridades
invertidas e péssima distribuição dos recursos
públicos entre as diversas prestadoras de serviço. Em
bom português, juízes, deputados, promotores e outros ganham
muito, professores ganham pouco. É preciso mexer nessa pirâmide.
Se o Brasil quiser dar um salto terá de colocar o professor em
primeiro lugar. Isso passa por uma elevação substancial
de salários. O ovo ou a galinha? Qualificar primeiro para aumentar
os salários depois? Aumentar os salários é o caminho
para a qualificação. Não se trata de uma relação
mecânica, mas complementar. O resto é papo.
O "especialista" que pontifica sobre a relatividade
dos salários na relação com o mérito deve
realizar o mesmo trabalho, com a mesma convicção, pela
metade do que ganha. É tudo lorota. Conversa para professor dormir
em pé. Tem consultor pomposo que adora falar em fuga de cérebros.
Obviamente para conter esses cérebros geniais é preciso
oferecer-lhes salários atrativos. Algumas pistas, a partir dessa
ideia, para entender professores: eles têm cérebro, muitos
desses cérebros são brilhantes, como qualquer cérebro,
o de professor quer ser estimulado e recompensado adequadamente pelo
seu trabalho. Continuamos na política nacional da "enrolation":
tentar convencer professor a dar tudo, ganhando pouco, por amor ao ofício.
Não cola mais. Está na hora da virada. É grana
no bolso.
Juremir Machado da Silva | juremir@correiodopovo.com.br
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