No RS, o número de menores de 18 anos que estudam na Educação de Jovens e Adultos (EJA) tem aumentado, indo contra a tendência nacional de redução
Adolescentes entre 15 e 18 anos dominam as turmas de Ensino Fundamental do supletivo no Estado
A Educação de Jovens e Adultos (EJA)
está se tornando cada vez mais Educação de Jovens
e Adolescentes, pelo menos no Rio Grande do Sul. Contrariando uma tendência
nacional de queda, a quantidade de menores de 18 anos no supletivo aumenta
ano após ano no Estado. Cresceu 10% apenas em 2010, conforme
os dados mais recentes do governo federal. Números da Secretaria
Estadual da Educação apontam continuidade do fenômeno
em 2011 na rede estadual.
No Rio Grande do Sul, 23,4% dos estudantes de EJA são
adolescentes, contra uma média nacional de 14,7%. Cinco anos
antes, a situação era de equilíbrio. Como o acesso
ao Ensino Médio da modalidade é restrito aos maiores de
idade, os adolescentes estão concentrados nas turmas de Ensino
Fundamental, nas quais se tornaram dominantes. Assim, podem completar
as séries em metade do tempo normal.
Não é uma situação isenta
de controvérsias. Em 2008, a Câmara da Educação
Básica do Conselho Nacional da Educação (CNE) aprovou,
por unanimidade, um parecer que elevava de 15 para 18 anos a idade mínima
para se matricular no EJA. Em meio à polêmica, o Ministério
da Educação decidiu não homologar a resolução.
Permaneceu tudo igual.
Há alunos que esperam apenas o aniversário
de 15 anos para trocar a turma seriada pela do EJA, em muitos casos
no mesmo estabelecimento de ensino. Rosaura Rodrigues, coordenadora
pedagógica do EJA da escola Universitário, notou uma explosão
dessa tendência nos últimos cinco anos:
— Eles querem entrar no mercado de trabalho e
percebem que, sem diploma, não vão conseguir. Como foram
reprovados na escola e perderam tempo, procuram uma modalidade mais
rápida.
A ânsia de recuperar o tempo perdido foi o que
motivou Fabíola Staudt da Silva, 15 anos, a optar pelo supletivo.
Em 2010, ela foi reprovada na 8ª série em uma escola estadual
de Estância Velha. Em 2011, a família transferiu-a para
um colégio particular. No meio do ano, veio uma mudança
para Dois Irmãos, e Fabíola teve de trocar de escola outra
vez. A mãe, Salete Staudt da Silva, 45 anos, diz que as notas
de um colégio não foram aceitas pelo outro, levando a
nova reprovação.
Após dois anos perdidos, a família viu
no EJA a saída para ganhar tempo. Fabíola termina o curso
na semana que vem. Vai tentar entrar em uma escola seriada de Ensino
Médio. A meta é estar diplomada no 1° ano já
em dezembro.
— Optamos pelo EJA para minha filha não
fazer a 8ª série inteira de novo. Foi a forma de não
perder mais um ano — diz Salete.
A Secretaria Estadual da Educação ainda
não tem explicação para o fenômeno.
— Não gostaria de emitir um diagnóstico,
porque não fizemos essa discussão. Temos de nos debruçar
sobre o tema para entender melhor — diz Adriana Soares Rodrigues,
assessora de referência da Educação de Jovens e
Adultos na secretaria.
Troca pode não significar educação
pobre
Para muitos profissionais da área, a troca do
ensino seriado pelo EJA não representa necessariamente uma formação
mais precária para o adolescente.
— Mantê-lo na escola regular, entre crianças,
pode não ser a melhor solução. O que preocupa é
a mudança de padrão. Com um público mais jovem,
o EJA precisa passar por uma revisão de currículo e propostas
— afirma Roberto Catelli, coordenador da área de EJA da
ONG Ação Educativa.
Adriana Soares Rodrigues, da Secretaria Estadual da
Educação, observa que ter adolescentes no EJA significa,
pelo menos, que eles não estão fora do sistema de ensino.
— Se o jovem não concluiu o Fundamental
até os 14 anos, significa que teve um percurso acidentado. Estar
no EJA não é um empobrecimento da educação
dessa pessoa. É dar conta das características da idade,
o que, às vezes, a proposta pedagógica da escola seriada
não faz. Não é só a carga horária
que dá qualidade.
Adriana diz que há necessidade de repensar a
estratégia da escola regular, para adaptá-la às
necessidades dos jovens. Segundo ela, a secretaria está fazendo
um estudo com a ideia de criar nas escolas gaúchas turmas nas
quais os alunos com defasagem entre a idade e a série sejam reunidos,
de forma que não se sintam deslocados.
A professora Maria Conceição Pillon Christofoli,
da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade
Católica (PUCRS), interpreta o fenômeno como um sintoma
de problemas na escola regular, que não está conseguindo
lidar com a diversidade de idades em sala de aula adequadamente.
Os porquês do fenômeno
Alguns fatores que contribuem para os adolescentes
optarem pelo supletivo:
Reprovação: alunos que repetem uma ou
mais séries tendem a ficar deslocados na escola. Com frequência,
abandonam os estudos. A solução é o EJA, onde vão
estudar com pessoas na mesma situação.
Dificuldades Socioeconômicas: a pobreza contribui
para afastar os adolescentes do ensino regular. Situações
familiares complicadas ou a necessidade de ficar em casa cuidando de
um irmão, por exemplo, podem motivar muitas faltas. Em outros
casos, as drogas e a violência afastam da escola.
Gravidez na adolescência: meninas que engravidam
tendem a deixar a escola regular depois de ter o bebê. Um dos
motivos é que, ao se tornarem mães, passam a ver a turma
como infantilizada e se sentem deslocadas. Em outras situações,
a adolescente tem de ficar com o filho durante o dia e opta pelo EJA
noturno.
Mercado de trabalho: alguns alunos estudam no EJA à
noite para trabalhar durante o dia. A necessidade de um diploma para
obter emprego, por outro lado, motiva muitos jovens que haviam abandonado
a escola a retomar os estudos pela porta do supletivo.
A facilidade do atalho: alunos que completam 15 anos
e ainda não terminaram o Ensino Fundamental optam, com alguma
frequência, por migrar para o EJA, para ganhar tempo.
As regras
A carga horária e o acesso ao EJA, segundo a
legislação:
Ensino Fundamental do EJA (5ª a 8ª séries)
- Idade mínima para ingresso: 15 anos
- Carga horária: 1,6 mil horas
- Carga horária das mesmas séries no
ensino regular: 3,2 mil horas
Ensino Médio do EJA
- Idade mínima para ingresso: 18 anos
- Carga horária: 1,2 mil horas
- Carga horária das mesmas séries no
ensino regular: 2,4 mil horas
Fonte: Zero Hora
Nenhum comentário:
Postar um comentário