Iniciativa do Enem é louvável, mas é injusto comparar escolas com diferentes realidades e perfis de alunos
As iniciativas de avaliação escolar parecem legítimas pela possibilidade
de subsidiar um balanço sobre o trabalho desenvolvido, o que permite
vislumbrar fragilidades no processo de ensino e aprendizagem, rever o
projeto pedagógico e estabelecer prioridades para o replanejamento da
vida escolar.
Este é o objetivo assumido pelo Enem: situar a escola perante o contexto
nacional, para que se possa reconfigurar metas e perspectivas de
trabalho em nome do aprimoramento do ensino.
Tomados como um indicador de qualidade, os dados favorecem a transparência entre escola e comunidade.
Se a intenção avaliativa é a princípio louvável, os usos que se fazem
dos resultados do Enem pelo ranking das escolas podem, entretanto,
comprometer seus propósitos, prestando um desserviço à sociedade.
Isso porque, na prática, o Enem acaba funcionando como um critério único
e reducionista de avaliação, que não faz justiça à complexidade dos
fatores envolvidos no processo educacional.
Por um lado, é injusto comparar escolas com diferentes realidades e
perfis de alunos; por outro, parece insuficiente que todo o esforço da
escola seja avaliado por uma única prova de conhecimento.
Admitir isso seria reforçar a tendência de uma educação centrada nos
saberes e habilidades cognitivos, em detrimento de aspectos pouco
mensuráveis, como a formação de valores.
Além disso, como o uso do Enem se presta ao sistema de propaganda das
escolas particulares, o ranqueamento gera uma competição descabida no
mercado educacional.
Uma busca que acaba por inverter o sentido da avaliação, já que o Enem
deixa de ser o balanço do processo pedagógico e passa a reger o próprio
funcionamento das escolas, muitas delas movidas pelo treinamento para o
exame.
No limite, o Enem é até motivo para a criação de "escolas-vitrine", com
alunos selecionados para garantir o cobiçado e lucrativo topo da lista.
Quando os fins justificam os meios, o projeto de formação humana de cada
escola corre o risco de perder a identidade, porque torna-se refém da
própria avaliação. Uma educação elitista na contramão dos princípios
democráticos.
Ponto de Vista de Silvia Gasparian Colello é professora da
Faculdade de Educação da USP - Folha de S.Paulo desta sexta-feira
(23/11).
Fonte: Portal do CPP
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