Juremir Machado da Silva
Logo no Rio
Logo no Rio
Tem gente que acha pensar uma coisa complicada e
tem horror dos chamados pensadores. Diante de um conceito, essa
palavrinha terrível, o sujeito começa a tremer ou a dormir. Modernidade é
um tempo e um conceito. Quais as principais características dessa tal
de modernidade: a crença no poder absoluto da razão (o homem como
sujeito consciente e racional a caminho da emancipação), o culto do
progresso, a ideia de que, por força da racionalidade, o mundo avançava
sempre para o melhor e, principalmente, a certeza de que a natureza,
considerava uma fonte de recursos inesgotáveis, devia ser subjugada
pelos homens. A produção, nesse sentido, estava acima de qualquer
cuidado com proteção do meio ambiente. Afinal, a natureza teria um poder
de regeneração acima de qualquer estrago.
É isso tudo que a chamada pós-modernidade pôs em xeque. Freud e
Nietzsche já haviam ferido nosso ego: o homem não age sempre consciente,
forças das quais não tem consciência, o dominam e impulsionam, a
verdade pode ser uma ilusão. Outra ferida que não cicatriza é a
descoberta de que o homem não é senhor absoluto da natureza e que este
tem limites. A ciência, como mostra Edgar Morin, faz descoberta que
geram progresso, mas também pode abrir caminho ao retrocesso e à
barbárie. A energia nuclear é um exemplar irrefutável dessa afirmação. O
conflito entre produção a qualquer custo e proteção à natureza opõe
esquematicamente os modernos, para os quais a economia está acima de
qualquer coisa, e os pós-modernos, mesmo que muitos não se reconheçam
nesse rótulo, convencidos que precisamos de uma nova equação capaz de
dar conta das necessidades sempre maiores de produção e da imperativa
obrigação de salvar e regenerar o planeta esfalfado.
Nossos ruralistas, como aquele personagem de Molière que fazia prosa
sem saber disso, são modernos tardios. A Rio+20, que vai começar no Rio
de Janeiro, é mais um round no combate entre essas concepções de mundo.
Logo no Rio, uma cidade que poderia viver exclusivamente dos seus
atrativos naturais e culturais, mas que continua atolada na poluição. O
Rio é uma cicatriz moderna. A modernidade teve dois modos de produção
antagônicos e complementares, o capitalismo e o comunismo. Em ambos a
produção sufocou qualquer preocupação com a preservação da casa dos
seres humanos, a Terra. A Rio+20 vai enfatizar a importância de um novo
modo de produção, o capitalismo mais limpo possível, cujo desafio
extraordinário é o de aumentar a produção diminuindo a devastação do
meio ambiente. É isso que os ruralistas, com suas 620 emendas depois da
Medida Provisória do Código Florestal não querem aceitar.
Uma mutação, porém, já aconteceu na mentalidade dominante. A opinião
pública quer produção limpa e sem trabalho degradante. Por isso o
#vetadilma atropelou o código ruralista aprovado na Câmara de Deputados.
A Rio+20 só vai acentuar essa percepção. O tempo da destruição em nome
da segurança alimentar está com os dias contados. Pode-se garantir
comida sem devorar a galinha dos ovos planetários. Mas o ovo não virá no
mole.
Fonte: Correio do Povo
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