Não haverá milagre que faça a educação brasileira dar o salto necessário
para colocar o País entre os mais desenvolvidos do mundo se não forem
superados os entraves básicos, a começar pela infraestrutura das
escolas.
O retrato de décadas de descaso, em que a construção de boas escolas não
passou de mera promessa em sucessivas campanhas eleitorais, está num
levantamento divulgado pelo movimento Todos pela Educação, segundo o
qual 44,5% dessas unidades dispõem somente do mínimo para seu
funcionamento, isto é, água, banheiro, energia, esgoto e cozinha. Não
têm biblioteca, quadra de esportes e laboratório, itens considerados
necessários para que o aprendizado se desenvolva de modo satisfatório.
Apenas 0,6% dos estabelecimentos pesquisados têm estrutura completa. É
um quadro desalentador.
A pesquisa tomou como base o Censo Escolar de 2011. Naquele ano, estavam
em funcionamento quase 195 mil escolas, cujos diretores responderam a
um questionário a respeito dos recursos disponíveis nos
estabelecimentos. A metodologia do estudo levou em conta que nem todas
as escolas necessitam de determinados equipamentos ou espaços, como
berçário.
Com isso, foi feita uma escala de categorias de infraestrutura que
considera as diferentes etapas de aprendizado. A categoria "elementar" é
aquela do mínimo necessário. Já na categoria "básica", além de água e
esgoto e energia elétrica, incluem-se aparelhos de TV e DVD,
computadores, impressoras e sala da diretoria. O nível "adequado"
demanda a presença de tudo isso mais acesso à internet, sala de
professores, biblioteca e espaços para o desenvolvimento motor e o
convívio social dos alunos.
No último nível, o das escolas "avançadas", aparecem também laboratório
de ciências e estrutura para atender alunos com necessidades especiais.
Para os pesquisadores, esse é o cenário considerado "mais próximo do
ideal" - e que é quase inexistente na rede educacional do País.
O mérito dessa pesquisa é mostrar que a precariedade das escolas, tanto
públicas quanto privadas, é um problema generalizado. Girlene Ribeiro de
Jesus, da Universidade de Brasília, que participou do trabalho, disse
que, por mais que esperassem resultados ruins, os pesquisadores se
chocaram com a quantidade de escolas classificadas no nível "elementar".
As diferenças regionais são ainda mais graves. Na Região Norte, 71% das
24 mil escolas têm infraestrutura apenas "elementar". No Nordeste, o
porcentual é de 65,1%, enquanto no Sudeste é de 22,7%, no Sul é de 19,8%
e no Centro-Oeste, de 17,6%. Mesmo nas regiões mais avançadas, a
maioria das escolas encontra-se no nível "básico". No Sudeste, apenas
19,8% são consideradas "adequadas".
Há também diferenças significativas quando se analisam as redes federal,
estadual e municipal. No nível federal, a maioria das escolas (62,5%)
são "adequadas" ou "avançadas". Já a maioria das escolas estaduais
(51,3%) está na categoria "elementar", enquanto 62,8% das escolas
municipais encontram-se nas categorias "elementar" e "básica". É na
esfera municipal, aliás, que o problema parece mais acentuado, pois é
nessa rede que se concentram quase 100% das escolas que estão mais
próximas do piso da categoria "elementar".
O estudo também confirma a percepção de que a precariedade estrutural
das escolas é um problema bem mais acentuado no campo do que na cidade.
Das escolas da zona rural, 85,2% estão no nível "elementar", ante 18,3%
nas áreas urbanas. Mesmo as escolas particulares - muitas das quais são
apenas caça-níqueis espalhados pelo País - apresentam graves problemas.
Nada menos que 72,3% desses estabelecimentos têm infraestrutura apenas
"elementar" ou "básica".
No momento em que se discute qual porcentual do PIB deve ser destinado à
educação, é importante ter em conta quais são as reais prioridades para
que se alcance a tão almejada revolução educacional - e é evidente que
as condições materiais das escolas desempenham nela um papel crucial.
Editorial do jornal O Estado de S.Paulo, publicação desta segunda-feira (3/6).
Fonte: SECOM/CPP